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Na república dos subsídios, só se engana quem tem fé em utopias

Alguns hábitos se tornaram tão arraigados no Brasil que não duvido que ainda chegará o dia em que os pais, ao perguntar para os filhos o que eles gostariam de ganhar de Natal, ouvirão como resposta: “Um subsídio”. Exageros premonitórios à parte, impressiona a velocidade com que a cultura dos benefícios do Estado se espraia a praticamente todos os setores da economia. Se existe algo no Brasil em que todos governos convergem, da direita à esquerda, é na generosidade no repasse de recursos gerados pelos pagadores de impostos aos setores mais protegidos por poderosos lobbies. A lógica é perversa. Quanto mais forte e rico é o segmento da economia, mais ele consegue acessar os favores dos governos, às expensas dos mais pobres, que não têm bancadas no Congresso para socorrê-los.

Imagino que de todas as promessas de campanha feitas pelo presidente Lula, a mais difícil de ser cumprida é a de isentar do pagamento de Imposto de Renda todos aqueles que recebem até R$ 5 mil mensais. Para ser justo, o atual governo até ampliou a faixa de isenção, que agora inclui quem ganha até dois salários mínimos. Mas falta muito para atingir a marca prometida. O problema é que esse movimento na direção de beneficiar quem está na base da pirâmide econômica implica em reduzir a massa daqueles que pagam o IR. Com isso, o governo deixa de arrecadar. E aí fica o dilema de como compensar a receita que deixa de entrar nos cofres públicos cada vez que se amplia a faixa de isenção.

A solução poderia estar nos cortes de subsídios, regimes especiais, benefícios ou salvaguardas concedidas para os setores dos capitalistas que recebem vantagens estimadas em estratosféricos R$ 500 bilhões/ano. Mas e como enfrentar os lobbies que não hesitam em agir para blindá-los? O mais paradoxal é que nos discursos todos defendem o enxugamento do Estado e a abertura da economia para se estimular a concorrência. Desde, é claro, que isso ocorra no setor do vizinho. Nos últimos meses, a mais renhida queda de braço entre governo e congresso tem como protagonista a desoneração de 17 setores da economia. Não vou tratar aqui de quem acho que tem razão. Mas vale lembrar que uma vez concedido, mesmo que por tempo limitado, os benefícios quase sempre se tornam para sempre.

No Brasil, banqueiro falido tem o Proer, produtor rural em dificuldade tem o lobby de congressistas para aprovar algum perdão ou renegociação de dívidas, e empresário urbano devedor muitas vezes acaba ganhando um Refis de presente. Todos defendem o corte de gastos públicos nos discursos. Mas todos se tornam keynesianos nos ciclos de vacas magras. Agora mesmo, o governo lança a Nova Política Industrial, conversa com empresas aéreas sobre como oferecer alguma forma de alívio, acena com favores aos fabricantes de navios, incentivos aos portos, não economiza em subsídios aos produtores rurais e por aí vai. Até mesmo as igrejas querem tirar uma lasquinha nesse milagre de multiplicação de benefícios. Logo, acreditar que essa cultura de favores sem contrapartidas possa acabar é uma das utopias que só engana quem quer ser ludibriado.

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