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Reforma tributária: trava de alíquota busca segurança para contribuinte e governo, apontam tributaristas

A Câmara dos Deputados aprovou a regulamentação da reforma tributária nesta quarta-feira (10), com uma trava para a alíquota geral do Imposto de Valor Agregado (IVA).

A alíquota média é composta pela soma do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), os novos tributos que passarão a ser aplicados a partir de 2026 — em um processo de transição que vai até 2033.

O primeiro entra como um substituto do ISS e do ICMS; enquanto o segundo do PIS/Cofins e, em conjunto com o Imposto Seletivo (IS), do IPI.

O mecanismo incluído no texto-base serve para fazer exatamente o que o nome sugere: impedir que a alíquota geral ultrapasse um nível determinado. No caso, o patamar estabelecido é de 26,5%.

O contribuinte médio, ao se deparar com esse número, geralmente se espanta com o peso previsto dos impostos pós-reforma. Tributaristas ouvidos pela CNN concordam que a alíquota geral é elevada, mas relembram que a proposta da reforma é de assegurar que a carga tributária atual não aumente ou diminua.

“Não haverá aumento de carga com o novo sistema porque a própria emenda constitucional determina que a calibragem da alíquota padrão deve ser feita de tal modo a compensar a arrecadação dos atuais tributos, de modo que há a trava para que esta alíquota padrão não ultrapasse a arrecadação atual”, afirma Melina Rocha, consultora do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e pesquisadora do Núcleo de Estudos Fiscais da Fundação Getulio Vargas (NEF/FGV) especialista em IVA.

Isso não significa que alguns setores não vão passar a pagar mais. Mas a proposta da reforma é de simplificar e tornar o sistema tributário brasileiro mais isonômico.

“A proposta é manter a carga tributaria e fazer com que não haja uma majoração global. Isso não significa que setores que antes pagavam menos vão seguir iguais”, explica Tathiane Piscitelli, coordenadora do grupo de pesquisa Tributação e Gênero da Escola de Direito de São Paulo da FGV.

“O que houve foi uma redistribuição [da carga tributária] a partir da unificação [dos impostos pelo IBS e CBS]. Ou seja, manter a carga atual com uma redistribuição entre as diferentes realidades econômicas”.

Os novos tributos serão aplicados gradualmente exatamente para que se tenha uma “transição segura para não ter aumento de carga tributária”, reforça Eurico Santi, diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF) e professor da FGV Direito SP.

O primeiro ano de vigência, em 2026, será de teste para o CBS e o IBS, com alíquotas de 0,9% e 1%, respectivamente.

Na sequência, se extinguirá o PIS/Cofins e será reduzida a zero a alíquota do IPI — exceto daqueles produtos oriundos da Zona Franca de Manaus —, enquanto o “imposto do pecado” e a CBS passarão a ser aplicados integralmente.

A partir de 2029, a proporção do IBS começará a aumentar em paralelo com a redução do ICMS e do ISS. Essa transição vai até 2033, quando a vigência da reforma passará a ser integral.

Com a manutenção da arrecadação atual, é a quantidade de grupos com impostos reduzidos ou zerados que pode pesar sobre o tamanho da alíquota.

Por exemplo, o ministério da Fazenda estima que a inclusão das carnes na cesta básica — assim zerando os impostos incidentes sobre o produto — pode elevar a alíquota geral em 0,53 ponto.

Ao final da transição, caso seja observada uma alíquota média maior que o teto estabelecido, deverão ser propostas medidas revisando os regimes beneficiados para impedir o aumento da carga geral.

“A trava é um gatilho para rever as alíquotas reduzidas, e com isso a arrecadação fica exatamente a mesma com a alíquota de 26,5% com a revisão das reduções de alíquota”, aponta Rocha.

“Ao fim do prazo, se tiver uma alíquota maior por conta das isenções, o governo deve mandar um PLP para manter a alíquota abaixo [da trava]”, complementa Piscitelli.

O que Marcel Alcades, sócio de direito tributário do escritório Mattos Filho, nota é a inspiração do mecanismo na dinâmica do arcabouço fiscal. Desse modo, ela age por duas vias: dando um conforto maior ao governo e servindo como uma bandeira vermelha sobre os níveis de arrecadação.

“Gosto da trava porque deixar a alíquota para normas posteriores é pior. Já dá segurança para o contribuinte. Ela já é super alta, mas estabelecer ela aqui é muito melhor do que deixar mais para frente”, avalia Alcades.

“[Colocar esse limite] deu muito conforto para quem era contrário à isenção da carne, e ajudou a destravar essa questão. E se [a alíquota] passar [da trava], significa que está faltando arrecadação, por conta das muitas isenções. Então será buscada a falta de arrecadação nas operações beneficiadas”, conclui.

Estados e municípios

Outro fator apontado como um agravador da alíquota geral mais elevada tem relação com uma questão federativa.

“[A alíquota de referência] será firmada de modo que estados e municípios podem aderir ou não a ela. Considerando que a ideia é manter a arrecadação, a ampliação resultaria em pressão na alíquota de referência”, afirma Piscitelli.

Pelo sistema federativo adotado no país, os estados e municípios brasileiros têm liberdade para estabelecer alíquotas diferentes da referência. Com a reforma, se optou por não retirar essa liberdade.

Para Alcades, do Mattos Filho, essa é uma questão que precisa ser trabalhada para se assegurar a sustentabilidade da trava.

“Eu tenho a trava, mas tenho a liberdade de municípios e estados estabelecerem alíquotas diferentes da referência. Essa é uma dificuldade do sistema que afeta negativamente a trava, porque pode haver lugares que ultrapassam a trava e outros que não. Isso precisa ser aperfeiçoado”, pontua o advogado tributarista.

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